Por Norberto Presta*:

Basicamente eu sou ator, e escutando as minhas necessidades como ator é que descobri o dramaturgo em mim. E além de ser ator sou um emigrante. O que tem que a ver isso com a dramaturgia?

Quando eu comecei a usar palavras que não dominava, não entendia, não entravam na minha boca, ainda não entram, surgiu a necessidade de usar mais o corpo do que a palavra para estar na cena. No início, na Alemanha, eu não sabia o idioma alemão, não entendia o que os meus companheiros falavam na cena, nem o que o público dizia. Isso foi um limite, que liberou outras possibilidades em mim.

Foi necessário priorizar o corpo, a sua presença e a relação física com os outros corpos, no espaço real onde a ação acontecia. Não podia me distrair, era necessário estar muito presente, muito ligado. E eu gostei disso. E com o tempo entendi que a realidade que eu queria vivenciar e compartilhar era a da própria cena.

A partir dum certo momento do meu trabalho como ator, descobri um modo de estar em cena que prioriza a minha presença em conexão direta com o acontecimento da ação, eu e a ação somos a mesma coisa, uma ação presença que está em relação com os elementos que integram o aqui e agora do evento teatral.

Dançar pensamentos, desencadear emoções, ser uma coisa com o tempo que passa como uma vibração pela ação e que vibra em uníssono com o público: o teatro como ritual pagão, na simples tarefa de redescobrir empaticamente as pessoas e as suas inquietações. Compreendi que como ator queria praticar essa realidade e o dramaturgo que me habita decidiu fazer a viagem comigo.

Daí o encontro com outras realidades teatrais foram iluminando o caminho. Foi com o descobrimento da dramaturgia do ator que apareceu, com mais claridade para mim, a dramaturgia como criação duma realidade, porque nada no teatro é mais real do que um corpo em cena, que propõe o aqui e agora como experiencia empática, como experiencia dos afetos, como experiencia criadora de pensamentos, e consequentemente como experiencia duma realidade transformadora, a partir do encontro dos corpos. Já não é um teatro que mostra a realidade e que a crítica, mas um teatro criador de realidades.

Gosto de ser um diretor-dramaturgo, o que procura perceber na dramaturgia do ator o espaço criativo a desenvolver em comum. Ao interno da dramaturgia do ator é o corpo entre o teatro e a dança o que me orienta.

Na arte, em geral, no teatro em particular, e ainda mais em um certo tipo de teatro, objeto e sujeito confundem-se na ação e é assim que muitas vezes aparecem como uma só coisa, unidade que faz o corpo do ator, a sua presença, ser o próprio objeto de arte, recipiente e conteúdo de uma ideia/emoção que transcende à sua própria vontade.

Deixar me orientar pelo corpo que tem a sua própria capacidade cognitiva da realidade e escutar, perceber essa capacidade cognitiva é o que me estimula para fazer o meu trabalho dramatúrgico.

*Norberto Presta é “Teatrante”, escritor, migrante, sonhador e realizador de sonhos. Ítalo-argentino atualmente reside entre Rio de Janeiro e Pádua, Itália. Desde 1971, ator, diretor, pedagogo e dramaturgo. Em 1981 começou a trabalhar entre a Europa e a América Latina escrevendo, dirigindo e atuando em mais de 100 espetáculos. Todas Norberto Presta quintas ele escreve sobre dramaturgia.


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