O Notícias de Teatro entrevista a atriz Marília Amorim, que também é educadora, co-fundadora do grupo teatral IMPULSO Coletivo, integrante da equipe de produção do 7º  Festival e Encontro Internacional KNOTS.NUDOS.NÓS – edição KILOMBO. Nesta entrevista exclusiva ela revela como será este festival itinerante que chega pela primeira vez a cidade de São Paulo e que terá a participação de 24 grupos e coletivos artísticos de países como Argentina, Brasil, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, México, Noruega e Venezuela. A 7ª edição do Festival e Encontro Internacional de Teatro de grupo Knots.Nudos.Nós acontece de 6 a 20 julho de 2024, com apresentação de espetáculos e oficinas em vários espaços culturais da capital paulista, sempre com entrada gratuita. (Foto em destaque Grupo Kokan Biulu – Bogotá – Colômbia).

Marília Amorim. (foto divulgação)

Notícias do Teatro – Explique para os leitores que ainda não conhecem o Festival, o que significa KNOTS.NUDOS.NÓS.

Marília Amorim – O festival KNOTS.NUDOS.NÓS é um festival internacional que nasceu com a proposta de ser itinerante, autogestivo e independente, baseado no princípio do encontro através do trabalho, promovendo a cultura do teatro de grupo. O termo em inglês “knots”, que faz alusão aos “nós” – laços e elos que são construídos entre os artistas durante a experiência imersiva de duas semanas de encontro, foi traduzido para o espanhol e português, expressando sua identidade plurinacional, sendo que no caso da expressão em português, “nós” se desdobra como um jogo de palavra, que não se repete nas outras línguas, ampliando seu sentido com a ideia de “todos nós” – uma coletividade cunhada a partir do encontro pelo teatro. Dessa maneira, o Festival e Encontro Internacional KNOTS.NUDOS.NÓS extrapola a noção de uma mostra de obras internacionais ou uma extensa programação cultural aberta ao público apenas, estabelecendo-se como uma rede de grupos capaz de transcender seus vínculos no tempo, encontrando continuidade de festival em festival.

Notícias do Teatro – Como será esta sétima edição, qual o principal diferencial para as anteriores?

Marília Amorim –  A organização deste festival,  por ser itinerante, ocorre a partir de um ou mais grupos integrantes da rede que se assumem como anfitriões do evento em seu país. Deste modo, a forma de pensar, criar e produzir o evento junto ao seu contexto local, levando em conta as características culturais, sociais, econômicas, políticas, faz com que cada edição seja sempre distinta uma da outra, apesar de se preservar o ‘espírito do festival’ em todas elas. Para a 7ª edição, a equipe de produção composta pelos grupos Impulso Coletivo de São Paulo-SP, Coletiva Corpo Território de São Paulo-Brasil e La Paz-Bolívia, e Coletivo Iúnas de Campinas/SP, trouxe pela primeira vez um tema para o festival – KILOMBO,  visando a construção de uma perspectiva ética do encontro permeada pelo pensamento afro-indígena e pelo conceito de kilombo, buscando agregar ao festival caminhos para uma consciência negra apoiada na representação simbólica do termo, que abrange conotação de resistência étnica e política. Além da temática trazida ao encontro, esta edição também é a primeira a contar com subsídio e apoio internacional do IBERESCENA – Fundo de Apoio para as Artes Cênicas Ibero-americanas, tendo sido selecionado pelo Programa de Apoio a Festivais 2023-2024 e que também trouxe como exigência o debate e registro documental do evento como uma ação de prevenção à violência baseada em raça, gênero, orientação sexual, deficiência física e/ou intelectual ou outras opressões estruturais. O apoio do IBERESCENA junto ao apoio da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo permitiram ampliar consideravelmente o número de grupos e países participantes nesta edição, que contará com 24 grupos integrando sua programação num total de aproximadamente 90 artistas participando dos 15 dias de festival.

Notícias do Teatro – Qual a expectativa de público alcançado?

Marília Amorim –  Serão 15 dias de programação inteiramente gratuita, que conta, na sua maior parte, com duas sessões de espetáculos diferentes por dia, além de oficinas abertas ao público. Além dos espetáculos em teatros e salas convencionais, também haverá apresentações na rua, como as da abertura do festival e a da finalização deste, que contemplará um grande cortejo com todos os participantes do festival nas ruas do centro de São Paulo. Tendo em vista a extensão da programação e o potencial dos espaços da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo em que acontecerão as apresentações, bem como as apresentações na rua, a equipe de produção espera alcançar pelo menos 4000 pessoas ao longo dos 15 dias do evento.

Notícias do Teatro – Sobre intercâmbio entre os países participantes quais os objetivos pretendidos?

Marília Amorim – O intercâmbio entre os grupos de diferentes países participantes é uma tônica e um diferencial desse festival. O encontro e a convivência entre os grupos é um dos principais objetivos do evento que visa agregar e fortalecer uma rede de teatro de grupo que se reencontra a cada edição, ressignificando seus laços no tempo. Esse encontro se dá em múltiplos níveis, começando com a convivência intensa durante os 15 dias de festival, em que os grupos realizam debates e assembléias sobre temas pertinentes à rede, organizam-se para dividir tarefas em prol do coletivo, como a limpeza e o cuidado com espaço em que se hospedam, por exemplo, criando uma ética de cooperação que permeia e se transfere para um processo de criação autoral coletiva, partilhada com o público ao final do evento. Neste processo, os grupos compartilham técnicas e procedimentos de trabalho teatral e realizam uma criação artística a partir desse intercâmbio, orientados por uma equipe de artistas locais. Nesta edição, a criação coletiva parte do tema Kilombo e terá direção de Jéssica Nascimento Olaegbé, orientação dramatúrgica de Abílio Ferreira, orientação em capoeira angola de Mestre Zelão e direção musical de Luciano Mendes de Jesus.

Notícias do Teatro – Quais foram os principais desafios para levantar a sétima edição?

Marília Amorim – O primeiro desafio foi a tomada de decisão sobre a cidade que sediaria esta edição. A princípio, havia possibilidade de levar a 7ª edição para Surubim, Pernambuco, mas não houve contexto econômico e social para realizar o encontro nesta região do país. Isso atrasou a produção do festival em um ano, que estava inicialmente previsto para janeiro de 2024. Para além do esforço de conseguir apoio financeiro para a realização do festival, que sempre se configura como uma batalha para um evento de tamanha grandeza, a sétima edição enfrenta o desafio de gerir esta edição com uma equipe muito reduzida, composta essencialmente dos membros dos grupos da rede KNOTS.NUDOS.NÓS que vivem em São Paulo. Soma-se a esses desafios uma das tarefas mais exigentes desta edição – a de conseguir apoios para demandas de alta prioridade, como a hospedagem e alimentação para 80 artistas durante 15 dias, pois o aporte financeiro logrado não era suficiente para custear o montante total de dias e artistas participantes. Nesse sentido, a equipe de produção dessa edição optou também por lançar campanhas de arrecadação de alimentos e em dinheiro, divulgada pela página do festival no instagram @knots.nudos.nos.

Notícias do Teatro – Qual foi a ordem de investimento financeiro neste festival e contou com quais apoios?

Marília Amorim –  Existente desde 2011, é a primeira vez que o festival é selecionado por um edital público, o Programa IBERESCENA – Fundo de Apoio para as Artes Cênicas Ibero-americanas, na linha de Apoio a Festivais 2023-2024. O apoio do IBERESCENA, no entanto, fica muito aquém das despesas totais de produção deste  festival. Além da ajuda recebida pelo Programa IBERESCENA, a Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo também participa com o apoio ao evento, contratando a maior parte dos espetáculos da programação e sediando todas as apresentações e oficinas do festival em equipamentos municipais. Somado a esses apoiadores, esta edição terá ainda a hospedagem dos mais de 80 artistas participantes garantida pelo Complexo Baby Barioni, na Barra Funda, numa articulação da equipe de produção do festival junto à Secretaria Estadual de Esportes de São Paulo e a FUNARTE, representando do país no Programa IBERESCENA. Apesar de todo o apoio conseguido para a realização desta edição em São Paulo, ainda o investimento financeiro do festival contará ainda com campanhas de arrecadação de alimentos, apoios de setores de alimentos e outros, venda de camisetas e sacolas durante o evento, além do aporte dos grupos participantes que custeiam a maior parte de suas passagens aéreas, bem como o trabalho de mais de um ano da equipe de produção para que o evento ocorresse.

Notícias do Teatro – O festival não poderia ocupar mais espaços culturais?

Marília Amorim –  O festival irá ocorrer em 5 lugares principais: Galeria Olido, Tendal da Lapa, Vila Itororó, Teatro Flávio Império e CRD – Centro de Referência da Dança, além de ocupar ruas, largos e praças em alguns momentos. Em edições anteriores, a programação sempre se concentrou em um ou dois espaços diferentes, é a primeira vez que ocupa tantos equipamentos assim. Além disso, há questões de logística do festival, que precisa deslocar mais de 80 artistas diariamente, que acompanham toda a programação, seja como atuantes, técnicos, oficineiros ou mesmo como público, gerando um grande empenho de traslados e montagens técnicas pela cidade.

Notícias do Teatro – Para terminar, como vocês avaliam a produção teatral desta edição, há alguma tendência?

Marília Amorim –  Há uma tendência sim e ela não é aleatória – está orientada pela temática desta edição – KILOMBO, e que foi divulgada aos grupos novos e aos que já integram a rede na convocatória da 7ª Edição do Festival e Encontro Internacional KNOTS.NUDOS.NÓS. Os grupos e obras selecionadas para esta edição possuem relação e consonância com a necessidade de prevenir e combater coletivamente o racismo, o machismo, o capacitismo, a LGBTQIAPN+fobia e qualquer outro tipo de opressão sistêmica. Nesse sentido, os grupos selecionados não só contemplam essa perspectiva em suas obras, como também contam com a presença de pessoas negras, indígenas, mulheres e LGBTQIAPN+ em suas composições, de modo a garantir a presença desses corpos e a pluralidade de suas vozes e poéticas em suas produções teatrais.

Instagram Festival:

https://www.instagram.com/knots.nudos.nos/


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